29/07/04

O Sonho que o Vasco não sonha...

Jorge Luís Borges
in A moeda de ferro




.............Ein Traum

........Sabiam os três.
........Ela era a companheira de Kafka.
........Kafka tinha-a sonhado.
........Sabiam os três.
........Ele era amigo de Kafka.
........Kafka tinha-o sonhado.
........Sabiam os três.
........A mulher disse ao amigo:
........«Quero que esta noite me desejes.»
........Sabiam os três.
........O homem respondeu-lhe:«Se pecamos,
........Kafka deixará de nos sonhar.»
........Um deles soube.
........Na terra não havia mais ninguém.
........Kafka disse:
........«Agora que partiram ambos, fiquei só.
........Deixarei de me sonhar.»


***...***...***
Quando abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer que encerram, estaremos finalmente fartos e satisfeitos?,WW

"O que é o virtual?,LÉVY, Pierre.

p. 25
"As coisas só têm limites claros no real. A virtualização, passagem à problemática, deslocamento do ser para a questão, é algo que necessariamente põe em causa a identidade clássica, pensamento apoiado em definições, determinações, exclusões, inclusões e terceiros excluídos. Por isso a virtualização é sempre heterogênese, devir outro, processo de acolhimento da alteridade."

p. 36 a 37
"Do texto, propriamente, em breve nada mais resta. No melhor dos casos, teremos, graças a ele, dado um retoque em nossos modelos do mundo. Talvez tenha servido apenas para pôr em ressonância algumas imagens, algumas palavras que já possuíamos. Eventualmente, teremos relacionado um de seus fragmentos, investido de uma intensidade especial, com determinada zona de nossa arquitetura mnemônica, um outro com determinado trecho de nossas redes intelectuais. Ele nos terá servido de interface com nós mesmos. Só muito raramente nossa leitura, nossa escuta, terá por efeito reorganizar dramaticamente, como por uma espécie de efeito de limiar brutal, o novelo enredado de representações e de emoções que nos constitui."

p. 54
"Até a segunda metade do século XX, uma pessoa praticava no final de sua carreira as competências adquiridas em sua juventude. Mais do que isto, transmitia geralmente seu saber, quase inalterado, a seus filhos ou a aprendizes. Hoje, esse esquema está em grande parte obsoleto. As pessoas não apenas são levadas a mudar várias vezes de profissão em sua vida, como também, no interior da mesma "profissão", os conhecimentos têm um cicio de renovação cada vez mais curto (três anos, ou até menos, em informática, por exemplo). Tornou-se difícil designar as competências "de base" num domínio."

p. 119
"se as pessoas são todas inteligentes à sua maneira, os grupos decepcionam com freqüência. Sabe-se que, numa multidão, as inteligências das pessoas, longe de se adicionar, tendem a se dividir. A burocracia e as formas de organização autoritárias asseguram uma certa coordenação, mas às custas da supressão das iniciativas e do aplainamento das singularidades."

p. 120
"Por que o 'mundo da cultura', no sentido burguês do termo, ou seja, os grupos humanos que produziram e desfrutaram a ciência, a filosofia, a literatura e as belas-artes, exerceu por tanto tempo tal atrativo? Provavelmente porque se aproximou, à sua maneira elitista e imperfeita, de um ideal da inteligência coletiva. Eis algumas das normas sociais, valores e regras de comportamento que regeriam (idealmente) o mundo da cultura: avaliação permanente das obras pelos pares e pelo público, reinterpretação constante da herança, inaceitabilidade do argumento de autoridade, incitação a enriquecer o patrimônio comum, cooperação competitiva, educação contínua do gosto e do senso crítico, valorização do julgamento pessoal, preocupação com a variedade, encorajamento à imaginação, à inovação, à pesquisa livre. Teremos começado a resolver numerosos problemas cruciais do mundo contemporâneo quando passarmos a pôr em prática um funcionamento 'culto" fora dos domínios e dos meios restritos onde este geralmente se instala."
/
"O ideal da inteligência coletiva não é evidentemente difundir a ciência e as artes no conjunto da sociedade, desqualificando ao mesmo tempo outros tipos de conhecimento ou de sensibilidade. É reconhecer que a diversidade das atividades humanas, sem nenhuma exclusão, pode e deve ser considerada, tratada, vivida como "cultura', no sentido que acabamos de evocar. Em conseqüência, cada ser humano poderia, deveria ser respeitado como um artista ou um pesquisador numa república dos espíritos."

(...)
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Quando abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer que encerram, estaremos finalmente fartos e satisfeitos?,WW

28/07/04


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Os castelos que nos aprisionam...

Tanto clamamos pela Liberdade, tanto lutamos por ela, tanto a sonhamos e acabamos por ser, nós próprios, os reais construtores dos castelos que nos aprisionam e roubam essa Liberdade. Há lá maior prisão que a rede de laços de afecto que vamos construindo ao longo da nossa vida? Há lá maior prisão que amar alguém!?

Talvez por isso sinta uma espécie de pavor sempre que novos laços começam a fiar-se...é uma sensação, algo alertante, do tipo da vozinha teimosa que sempre nos segreda nos momentos menos oportunos: "toma atenção!, não te metas nessa!, já sabes onde vais parar!", mas...a atracção do abismo é inebriante, não é!?

É por essas e outras que adoro gatos...melhor, invejo-os!

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26/07/04

«Não me atrevo»

Não me atrevo a adivinhar o que tu sentes
Quando tens quatro paredes por morada
E lá fora sabes que és mais um ausente
Que um dia apostou na carta errada.

Não me atrevo sequer a falar das horas
que tu passas conversando com os segundos
que te ouvem quando às vezes te demoras
a pensar se há mundo entre os nossos mundos.

Não me atrevo a imaginar p’ra onde vais
quando partes navegando pelos sonhos,
quando voltas à frieza deste cais
à distante realidade que nós somos.

Não me atrevo a adivinhar a vida inteira
que tu passas em revista a cada dia.
Os momentos que tu lanças prá fogueira
e as memórias que tu guardas por mania.

Quando um dia me puderes ir visitar,
não te vires para trás nem um momento.
Segue o caminho que te leva à beira-mar
dança com ele e faz de conta que és o vento.

Não me atrevo a caminhar pelos teus pés
que regressam sempre ao ponto de partida.
Que te levam por caminhos que não vês
e te acordam junto à porta de saída.

Não me atrevo a perguntar por quem te espera
quando chegar a hora de matar saudades.
Espera-te o mar, porque esse nunca desespera,
e te ensinou como é amar Liberdade.



Luís Represas, "A Hora do Lobo"

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17/07/04

Quando outros dizem [magistralmente] como nós não sabemos...

...o que gostaríamos, também, de gritar...só nos resta copiar...

tinta crua

TCA 2004


"hoje escrevo eu por ti.
é minha a liberdade que não tens!
vou rasgar o papel e mostrar a fúria
a revolta sem resignação.
posso até revelar a ternura
e essa estúpida e ridícula honra
que defendes com tanta paixão.
hoje sou eu que mando aqui
nestas folhas que ora rasgas
ora transformas em luxúria.
vou revelar os teus segredos
esses que escondes nos riscos
ilusoriamente suaves e doces.
vou falar de medo e de loucura
e do passado que te assombra.
porque hoje sou eu e livre aqui
na palma indefesa da tua mão
vou é calar o medo que senti
quando inventaste tamanha cor
com a alma em carne viva
e um resto negro de carvão.
TCA 2004"


...obrigada...

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16/07/04

SER POETA moderno

Ser poeta é ser mais alto,

é bater com os cornos no tecto...

É ter de mil desejos o esplendor,

e ficar frustrado frente ao televisor!

É ter cá dentro um astro que flameja,

e na estupidez circundante ser só uma vela que almeja!

É ter garras e asas de condor,

e levar chumbada da maralha agachada!

É ter fome, é ter sede de infinito,

não ter cinco euros p'ró bitoque e beber meio tinto na tasca do jacinto!

É condensar o mundo num só grito,

e ficar roufenho vociferando esse tamanho berro quejando!

E é amar-te assim,

embriagadamente...

É seres corpo

e sexo e sábado à noite em mim

E dizê-lo

em karaoke a toda a gente!



posted by elmano

[hummmm...apesar de ser A "minha" FlorBELA...ok! ...ficas perdoado tendo em conta a qualidade da "produção" anterior... ;-)]

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Ser poeta
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens!Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

FLORBELA ESPANCA

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14/07/04

Que Sera, Sera

When I was just a little girl,
I asked my mother, "What will I be?
Will I be pretty? Will I be rich?"
Here's what she said to me:

Que sera, sera,
Whatever will be, will be.
The future's not ours to see,
Que sera, sera,
What will be, will be.

When I was just a child in school,
I asked my teacher, "What shall I try?
Should I paint pictures?
Should I sing songs?"
This was her wise reply:

Que sera, sera,
Whatever will be, will be.
The future's not ours to see,
Que sera, sera,
What will be, will be.

When I grew up and fell in love,
I asked my lover, "What lies ahead?
Will we have rainbows day after day?"
Here's what my lover said:

Que sera, sera,
Whatever will be, will be.
The future's not ours to see,
Que sera, sera,
What will be, will be.

Now I have children of my own,
They ask their mother, "What will I be?
Will I be pretty? Will I be rich?"
I tell them tenderly:

Que sera, sera,
Whatever will be, will be.
The future's not ours to see,
Que sera, sera,



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08/07/04

"Alegria onde te demoras?"

«Amanhã


Não me digam que espere, eu quero já.

Cedo era ontem, amanhã é tarde.

Capitão de navios que já não há,

não vou deixar que o tempo me deserde.

Portanto, agora!

Hoje é que eu sou no gume da navalha.

Todo o minuto de outra hora

é a margem-viagem que me falha.

Já é que eu sou – e não me peçam nada

para amanhã, que é tarde.

Larguei todo o meu pano à madrugada,

não vou deixar que o tempo me deserde.»

Torquato da Luz


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"O beijo-borboleta é o pontífice dos beijos.

(...)É carinho destilado no estado mais puro.(...)"quando estivermos juntos te darei um beijo-borboleta"

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06/07/04

Uma outra visão do resultado...da histeria colectiva!

«O Esférico Rolando...

A derrota da selecção nacional de futebol, frente à Grécia, deixou-nos a todos com um travo amargo na boca. É certo e, talvez, sabido que a História não se lembra dos segundos lugares, nem se escreve com os nomes dos vencidos, mas, mesmo assim, há certos aspectos positivos que toda esta “epopeia” trouxe e que, pelo menos por ora, conseguem sobrepor-se ao morrer, mais uma vez, na praia.
(...)
Sempre o querer parecer bem. Mas sem o parecer. Muito menos o ser.
Pergunta-se agora se vale a pena eleições antecipadas ou não. Ao que tudo indica, ao sr. Durão já não lhe interessará muito o tema. Tem agora um tacho mais bem pago e não terá de ficar para assistir ao circo. Quanto aos outros... Não sou adepto da democracia, mas querer manter um governo que, como se viu nas últimas eleições, já não representa essa mesma maioria ilusória, que conduziu o país a uma grave crise económica e social, que o vendeu (i)moralmente aos interesses dos lobbys da guerra e do saque, que o fez cair numa crise de confiança- e não é à toa que o futebol teve tanto impacto (as pessoas esquecem-se dos seus problemas, projectam as suas esperanças pessoais num evento desportivo, a exemplo de sociedades de perfis terceiro-mundistas como é o caso do Brasil)... apenas porque burocraticamente é possível... realmente, ainda acho mais ridículo que o rato que saiu do navio que se afundava...
... enquanto os marinheiros jogavam à bola.»



Ricardo Mendonça Marques, in disakala

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Walt Whitman

"Esta manhã, antes do alvorecer, subi numa colina para admirar o céu povoado,
E disse à minha alma: Quando abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer que encerram, estaremos finalmente fartos e satisfeitos?
E minha alma disse: Não, uma vez alcançados esses mundos prosseguiremos no caminho."


Walt Whitman

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04/07/04

Porque uma Borboleta me faz lembrar SOPHIA...

«Da superioridade dos beijos-borboleta

Primeiro, o modo de usar: aproxime-se o olho do rosto que se vai beijar e, à distância de meia-pestana, cerrem-se e abram-se as pálpebras em cadência na imitação do vôo e brisa das borboletas.

O beijo-borboleta é o pontífice dos beijos. É carinho destilado no estado mais puro. Mas é também sensualidade porque não se aproximam olho e rosto desta forma impunemente.

Um beijo-borboleta é ainda sinal de aliança. Ninguém dirá "mando-te um beijo-borboleta", a frase é ridícula mas pelos maus motivos, não há nada mais presencial do que um beijo-borboleta. Alguém poderá dizer, pelo contrário, "quando estivermos juntos te darei um beijo-borboleta", e isso é tão forte como palavras de futuro, como um anel de noivado.

"Mandas beijos? Sim, sim, isso é agradável", pensou, "mas o que eu queria de ti era mesmo a promessa de uma borboleta no meu rosto".»




Por Tawzeeto,14 de março de 2004, in Sous les Pavés, La Plage!


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da revolução ao sonho



...agradou-me, logo de início, aquele traçado revolto!...gosto de revoluções, gosto de revolucionar...depois, depois um certo ar de expectativa, como que a preparar(me) para a revolução...como que a tomar fôlego para a...subida final!...aquele traço que sobe é a ascensão aos céus do(meu) sonho...por fim gostei(amei!) as pontas que não se tocam...deixa-me o espaço imenso - do sonho - por minha conta!


[Abstracto Concreto - grata pela tua generosidade]

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