Apetece-me recordar...(1)' o que me impede (...) é a inexistência dos cartões dourados e ilimitados'
«Ora vejamos, e porque não, como me orientar então
Ora vejamos, e porque não, como me orientar então nesta tempestade prenúncio de meia idade.
Qual ternura dos quarenta, qual dengosa aptidão familiar. Qual carreira, qual carapuça. Qual lar montado, qual alegria das raízes. Não senhor, nada de suaves enganos nem de vida equilibrada.
Somente com um ou mais cartões de crédito douradíssimos e ilimitados seria feliz. Porche alugado e jacto fretado. Alma embalada, vida aviada e estar de abalada. Nórdica de oitocentos euros hoje, nipónica de mil dólares amanhã. Vida peregrina em hotéis de cinco estrelas. Ser cometa humano sem trajectória definida mas com James Martins a horas certas. Pequeno almoço em Roma, t-bone no Oklahoma. Brioches com champagne às cinco na Côte D'Azur. Jantar pato em Pequim para cear bokwursts em Berlim. Retiro espiritual no Hilton do Bali, seguido de conferência de imprensa acerca do sentido da vida no Four Seasons de Bangkok. Asceta em lençóis de seda e profeta de jacuzzi baptismal. Saltimbanco sem destino, vestido com Armanis comprados de véspera. Camisas descartáveis, cuecas idem, peúgas aspas aspas, sapatos ibidem. Andarilho de profissão inscrita no passaporte. Poeta niilista sem meta prevista e com garrafeira à vista. Prosa elaborada inscrita apenas com o suor na toalha abandonada junto à marmórea sanita. Sem-abrigo de saudade mas com room-service nostálgico. Esteta do efémero, estátua em movimento, criador de partidas, sonhador em viagem, forcado de destinos, atleta de distâncias. Polaroid literária com registos diários para entrega imediata a fortuitos e ocasionais leitores, sem ficar com negativos. Dando de caras com o amor, diria a essa mesma flor que sou só pólen e a mais não sou obrigado. E quando a morte chegasse, deixar-me de frases profundas ou visões imundas, e dando o número do visa na recepção, trataria da cremação.
Voltando ao lugar de partida, sinto que o que me impede de tal odisseia é a existência dos meus filhos, lindos e aprumados. No entanto, ao anular a partida, vejo que o que me impede de concretizar a ideia, ditado pela consciência, é a inexistência dos cartões dourados e ilimitados.
Ora vejamos, e porque não, como me orientar então nesta tempestade prenúncio de meia idade.
Qual ternura dos quarenta, qual dengosa aptidão familiar. Qual carreira, qual carapuça. Qual lar montado, qual alegria das raízes. Não senhor, nada de suaves enganos nem de vida equilibrada.
Somente com um ou mais cartões de crédito douradíssimos e ilimitados seria feliz. Porche alugado e jacto fretado. Alma embalada, vida aviada e estar de abalada. Nórdica de oitocentos euros hoje, nipónica de mil dólares amanhã. Vida peregrina em hotéis de cinco estrelas. Ser cometa humano sem trajectória definida mas com James Martins a horas certas. Pequeno almoço em Roma, t-bone no Oklahoma. Brioches com champagne às cinco na Côte D'Azur. Jantar pato em Pequim para cear bokwursts em Berlim. Retiro espiritual no Hilton do Bali, seguido de conferência de imprensa acerca do sentido da vida no Four Seasons de Bangkok. Asceta em lençóis de seda e profeta de jacuzzi baptismal. Saltimbanco sem destino, vestido com Armanis comprados de véspera. Camisas descartáveis, cuecas idem, peúgas aspas aspas, sapatos ibidem. Andarilho de profissão inscrita no passaporte. Poeta niilista sem meta prevista e com garrafeira à vista. Prosa elaborada inscrita apenas com o suor na toalha abandonada junto à marmórea sanita. Sem-abrigo de saudade mas com room-service nostálgico. Esteta do efémero, estátua em movimento, criador de partidas, sonhador em viagem, forcado de destinos, atleta de distâncias. Polaroid literária com registos diários para entrega imediata a fortuitos e ocasionais leitores, sem ficar com negativos. Dando de caras com o amor, diria a essa mesma flor que sou só pólen e a mais não sou obrigado. E quando a morte chegasse, deixar-me de frases profundas ou visões imundas, e dando o número do visa na recepção, trataria da cremação.
Voltando ao lugar de partida, sinto que o que me impede de tal odisseia é a existência dos meus filhos, lindos e aprumados. No entanto, ao anular a partida, vejo que o que me impede de concretizar a ideia, ditado pela consciência, é a inexistência dos cartões dourados e ilimitados.
» embasbacado, 2004-09-28
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(Magritte)/"Quando abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer que encerram, estaremos finalmente fartos e satisfeitos?",WW