24/10/04

«Os Amigos»

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Os amigos. Entrariam por uma casa em chamas para nos salvarem. Mentem por nós à nossa própria mãe. Sabem de nós mais do que somos capazes de lhes dizer. Jurariam que à hora do crime estávamos a tomar chá com eles. Mesmo que a polícia nos encontrasse com as mãos sujas de sangue. 'São rosas, senhores. Andei com ela toda a tarde a cortar rosas, senhores. Sangue de espinhos, senhores.'

Eles exigem-nos coisas de nada. As nossas lágrimas. O nosso lenço de assoar. A pele dos nossos inimigos. As batatas fritas do nosso bife. A nossa melhor roupa, por uma noite. Exigem-nos tudo o que nos dão. É preciso regá-los regularmente: é nos ombros deles que cai toda a água dos nossos olhos. Eles espevitam-nos o sentido de humor quando menos nos apetece. E depois ficam connosco quando as luzes se apagam e toda a gente se foi embora. Só aos amigos é dado o espectáculo da nossa miséria.(...)»

A Instrução Dos Amantes, Inês Pedrosa

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(Magritte)/"Quando abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer que encerram, estaremos finalmente fartos e satisfeitos?",WW

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