"O amor altruista...existe?"
Incondicionalidades(...)
Esta frase espantosa - "Amo-te, faças o que fizeres" - é tão bonita quanto perigosa.
É bonita porque é. Mas, se quisermos justificar e encher umas linhas de argumentos, sempre dá para dizer que o amor só deixa de ser um sentimento ou uma emoção singular e pessoal, entre outros, se puder ganhar uma qualquer transcendência. Das transcendências possíveis aquela que se inscreve numa estética cega a qualquer moral é, de longe, a mais grandiosa.
Um amor sem condições é um amor perfeito, um amor mítico, um conceito que, de tão abstracto e supra-relacional, é o lugar do desejo e da plenitude: um amor incondicional.
Exactamente porque esta forma bonita de pôr as coisas é, apenas e só, uma figura de estilo que é perigosa.
Muita gente despreza o estilo e agarra-se à convicção da literalidade da coisa.
Muitos têm dificuldade em perceber que a incondicionalidade é uma ideia e não um tipo de relação.
Daqui resultam coisas extraordinárias quase sempre queixosas, infelizes, em tom de reclamação ou de direitos básicos malevolamente atraiçoados.(...)
São sucessivas gerações de amantes que exprimem de mil maneiras, mas sempre com perplexidade, como é que foi possível que o outro tão devoto, tão presente, tão cheio de promessas e de gestos de amor, um dia tenha mudado.
Há demasiada gente a acreditar que a incondicioalidade é possível, a defender até que o amor, "para valer" e "a sério" só mesmo aquele que tudo perdoa, tudo esquece, aquele que não precisa que se faça nada para continuar a existir, aquele que é aceitante, apoiante e infinito. Como se não houvesse mérito ou não valesse a pena ser gostado na circunstância de se ser adequado, corresponder às expectativas e fazer para agradar.
Porque o amor é um sentimento ancorado numa relação precisa de cuidados e desvelos para que cresça e se mantenha.
Toda a gente sabe isto, mas, espantosamente, muitos continuam a acreditar que não têm que se esforçar e que têm direito a ser amados. Incondicionalmente.
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in «Gostar de Quem Não Gosta de Nós», conj. de Crónicas de Isabel Leal(Psicóloga), ed.Jan.2001
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(...colocado algures num fórum sapista em 06.09.2001 10:28, por lydia43)
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